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OPINIÃO: O perfume de Silvana

Há uma classificação para determinados tipos de rastros que considero periculosa, hipnótica. É aquele faro rastreador de um código de identidade que entorpece: perfume de mulher. O perigo está no inexato momento em que este ópio ensandece. Às vezes lírio, avesso, vinte e poucos anos. Outras, azaléia, tontura, "mea culpa". E tem aqueles cheiros que não rastreamos, mas que invadem nossas narinas e sentidos: o cheiro da chuva, de domingo, de margaridas, daquela gaveta. E a comprovar que somos eternamente tristes, um dossiê de saudades, atestando que a vida bem podia ser mais divertida.

Pois para ti relembro, por me quereres tanto bem, que apenas Silvana usava o perfume que esses dias senti abrandado no ar, quando passei por alguém que contornava sem pressa os becos poetizados desta Feira do Livro. Meia-volta, volver, frente pra trás, contornado o chafariz, e já andava por perto da mulher que tinha o cheiro do perfume de Silvana. Segui, por entre livrarias e sebos incensados, os andares daquela mulher lindíssima, com olhos de Barbie, um tanto bronzeada pelo sol inquieto deste outono que já se faz fugaz pelas figueiras, ipês, guapuruvus e extremosas. Bastava-me, vez que outra, a aproximação dissimulada, o falso interesse por alguma obra de seu particular apreço, só para respirar com avidez aquele perfume que só encontrei na pele, nas roupas, no travesseiro de Silvana.

Procurei, em outras segredadas paixões, o exclusivo perfume de Silvana, e o aroma sentido sempre foi diverso, menos adocicado, puxando mais para o banal, sem aquele odor de fruta madura a se abrigar em concha dentro de mato fechado. Nunca me ative ao nome da fragrância. Naqueles meses em que amei Silvana, não sobrou um só tempo para decorar a marca do seu perfume, tal era a desimportância da indagação diante do estado em que se apresentava uma alma de passarinho enfiada num corpo de moço que fui um dia.

Estou certo de que não mais a verei, e essa verdade abriu uma goteira lacrimal dentro de mim, sem jeito de estancar. Ela foi indo embora na ponta dos pés, sem deixar recado, bilhete ou abano, recebendo em tardes arrebóis, segundo me disseram, a visita do arco-íris quando o silêncio adormece rebrotado.

Ficou daquele amor perdido em brumas o seu perfume, e ainda hoje sigo atrás quando o sinto espalhado no ar por um corpo de mulher; um corpo que não precisa ser novo ou bonito, com olhos de Barbie ou bronzeado. Basta ter o cheiro de Silvana e haverá, a rondá-lo, a romaria de um homem que caminha resolutamente só.

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